Pintor e escritor, participou da Revolução Mexicana (1910), foi ativo militante do Partido Comunista de México e protagonista do Movimiento Muralista – defendendo uma arte revolucionária e em sintonia com as lutas dos trabalhadores Por Felipe Santos Deveza * SIQUEIROS, David Alfaro (mexicano; Chihuahua/México, 1896 – Cuernavaca/México, 1974) 1 – Vida e práxis política David Alfaro Siqueiros, nascido José Jesus Alfaro Siqueiros, foi registrado como sendo natural da Cidade do México; porém, segundo hoje se sabe, nasceu na capital do estado de Chihuahua (Noroeste mexicano). Com cerca de 6 anos, mudou-se para Irapuato, no estado de Guanajuato, onde começou seus estudos. Aos 12 anos, pintou uma reprodução da Madonna della Seggiola, do artista renascentista Raphael, fato que entusiasmou seu pai para que contratasse o pintor muralista Eduardo Solares Gutierrez como seu professor. Dois anos depois, começou a frequentar a Academia de San Carlos e participou da Escuela de Pintura al Aire Libre, de Santa Anita – experiência que pretendia renovar os exercícios de pintura, naquela época ainda muito ligados à tradição acadêmica europeia clássica e confinados em espaços fechados. Durante as batalhas da Revolução Mexicana, mais especificamente após o golpe de Victoriano Huerta contra o governo de Francisco Madero (em 1913), alguns alunos da Escuela de Bellas Artes se alistaram entre as tropas revolucionárias; dentre eles Siqueiros, que serviu no Exército Constitucionalista até 1917, quando foi promulgada a nova constituição. Como soldado, viajou por todo o país, conhecendo melhor a cultura mexicana e travando contato com as lutas cotidianas dos operários e camponeses. Em Guadalajara, o jovem pintor conheceu a sua primeira esposa, Graciela Gachita Amador – que estudava folclore e dirigia teatros de bonecos –, com quem se casou em 1918. Nesta cidade, Siqueiros ajudou a organizar um congresso de Artistas Soldados e debateu com seus companheiros a polêmica que seguiria como um tema recorrente por várias palestras e artigos durante a sua vida: a relação entre a função da arte e sua forma; ou, de outra maneira, a relação entre política e pintura. Em 1921, Diego Rivera, que então estava vivendo na Europa, foi convidado por José Vasconcelos – ministro da Educação do governo pós-revolucionário de Álvaro Obregón (1920-1924) – para participar de um projeto que envolvia pintura. A ideia original do ministro era dar continuidade à pintura nas paredes dos prédios públicos com temas educativos dirigidos à população mexicana analfabeta ou com pouco acesso à literatura, à história e à ciência; para tanto, contratou uma série de artistas, entre eles Siqueiros (que regressaria a seu país em 1922), para interpretar a história mexicana e decorar as paredes de dois prédios públicos, no centro da capital. Estes murais inaugurariam o Movimiento Muralista Mexicano, nos anos 1920. Embora o projeto original tivesse um sentido educativo ainda estreito, a influência da entrada de grande parte desses muralistas no Partido Comunista de México (PCM) reorientou o conteúdo da proposta inicial das obras murais; Siqueiros desempenhou um papel fundamental de articulador e porta-voz do grupo. Foi a partir de sua iniciativa que nasceu o Sindicato de Obreros Técnicos Pintores y Escultores (SOTPE), agremiação que fundou o jornal El Machete (1924) – que no ano seguinte se tornou órgão central do PCM. O sindicato, organizado pelos muralistas, foi originalmente influenciado por uma perspectiva anarco-sindicalista – em uma época na qual o marxismo-leninismo apenas começava a ser divulgado no México. Desde então, e até os anos 1940, Siqueiros se dedicou à construção do Partido Comunista, de sindicatos e de organizações camponesas – como as Ligas Agraristas, influenciadas pelo PCM. Durante esse período, participou mais de greves, reuniões clandestinas, congressos operários e sindicatos, do que propriamente da realização de murais. Sua atividade artística esteve muito direcionada às charges publicadas em jornais operários, às caricaturas e à produção gráfica. O jornal El Machete, a revista peruana Amauta (de Mariátegui), a Correspondencia Sudamericana e El Liberador (onde Tina Modotti e Julio Mella publicaram artigos) tiveram impressos desenhos de Siqueiros – além dos materiais de propaganda dos sindicatos e das Ligas Agraristas. A partir de 1929, o PCM se tornou ilegal e inúmeros comunistas foram perseguidos. Siqueiros viajou então por diversos países, articulando o movimento comunista; participou do Congresso Sindical Latino-Americano, em Montevidéu, e representou o PCM na I Conferência Comunista Latino-Americana, ocorrida em Buenos Aires. Nesse meio tempo, havia também visitado a União Soviética (1927-1928), junto com o muralista Diego Rivera, e conhecido pessoalmente Josef Stálin, por intermédio de Vladimír Maiakóvski; este encontro foi narrado em suas memórias, num tom bem-humorado, onde revela, por exemplo, que o líder da URSS aprovava suas críticas sobre o excesso de academicismo na pintura soviética, mesmo depois de dez anos da Revolução Bolchevique. Em 1930, Siqueiros foi preso por suas atividades sindicalistas; na prisão produziu uma série de pinturas de cavalete e litografias. A partir deste ano, em um contexto de perseguição aos comunistas, os muralistas acabariam tendo que se mudar para os Estados Unidos, onde encontraram um entusiasmado público de jovens artistas interessados na novidade dos afrescos dos pintores mexicanos. Nos EUA, a obra de seu colega Diego Rivera obteve reconhecimento internacional, mas o período também correspondeu à cristalização de divergências entre os muralistas; o interesse pela obra de Rivera estava em sua temática mexicanista, em sua valorização das cores e dos motivos do México popular em composições épicas e ideologicamente engajadas com a luta política da época, expressa na dicotomia “revolução versus capitalismo”. Siqueiros, um inquieto polemista, começou então a criticar a obra de Rivera e a tentar apontar uma outra direção ao trabalho artístico desenvolvido pelos muralistas mexicanos. Após o golpe de Estado do general Francisco Franco – contra a II República Espanhola (1936) –, Siqueiros se alistou como voluntário nas Brigadas Internacionais; como tenente-coronel, lutou no fronte de batalha da Guerra Civil da Espanha. Após a queda de Barcelona e da ajuda prestada na articulação dos exilados, o comunista mexicano retornou a seu país. Junto à direção do PCM, em 1940, no calor do conflito com os nazistas, participou de uma tentativa frustrada de matar TrótskiContinuar lendo “O marxismo de David Alfaro Siqueiros”