Acerca de Freixo

Deputado desembarcou do PSOL em direção a um amplo arco de alianças, no intuito de formar uma frente eleitoral contra a extrema direita nos cenários estadual e nacional   Por Wanderson Fabio de Melo*   Tenho lido muito moralismo sobre a saída de Marcelo Freixo do PSOL. Entretanto, como dizia Karl Marx, “o moralismo é a impotência posta em ação”. Penso que devemos compreender as circunstâncias e as condições desse acontecimento político, com vistas a entender o que se passa, isto é, buscar o que levou à transferência de uma das principais figuras públicas do Parido do Socialismo e Liberdade ao PSB (Partido Socialista Brasileiro) e, por consequência, a sua nova ação ideopolítica para o Rio de Janeiro e o Brasil. Freixo desembarcou do PSOL em direção a um amplo arco de alianças, no intuito de formar uma frente eleitoral contra a extrema direita nos cenários estadual e nacional. A candidatura Freixo pelo PSB ao governo do Rio de Janeiro poderá juntar as forças políticas no estado e se somará ao apoio à candidatura de Lula ao Executivo federal. Alvora-se que o “radicalismo” do PSOL impediria que uma figura do partido encabeçasse a chapa com possibilidades eleitorais. De acordo com essa avaliação, Freixo deixou o PSOL e está cercando-se de políticos e personagens outrora adversários, como os setores da direita moderada, para recompor o tecido social no estado, que está dominado pelas milícias e a extrema direita. Propala-se o esforço de “civilização contra a barbárie”. Indiscutivelmente, Marcelo Freixo foi durante muito tempo o quadro mais importante do PSOL. Freixo traz a história fortíssima de uma família atacada pela milícia e, além disso, está jurado de morte pelo poder paralelo, a ponto de não poder se dirigir à determinados territórios do Rio de Janeiro. Apesar das dificuldades, Freixo é um parlamentar que sabe trabalhar com muita competência no Legislativo, com destaque importante na chamada CPI das Milícias, na Alerj. Mas não só. Sem sombra de dúvidas, a saída de Freixo resulta no desfalque a ser sentido no PSOL, que perde em votos (isso deve ser considerado em um partido parlamentar em tempos de cláusulas de barreira), expressão social e quadro político de referência para muitos dos seus militantes e eleitores. Dois elementos a destacar na trajetória de Freixo na fase do Socialismo e Liberdade: o primeiro, a importância das questões dos Direitos Humanos na cidade do Rio de Janeiro, no estado e no Brasil. Freixo emergiu politicamente com essa pauta. A formação social brasileira e o seu capitalismo dependente e subordinado deixam evidente a incapacidade de se garantir as condições jurídicas mínimas ao povo pobre das periferias e favelas, dominadas ou pelo estado autocrático, ou pelos poderes paralelos do tráfico e das milícias. Não há garantia de direitos básicos aos trabalhadores precarizados em vários territórios do Brasil. Sendo assim, os temas dos Direitos Humanos tornam-se relevantes em todo o país. A trajetória corajosa de Marcelo Freixo tem ensinado isso a quem quiser aprender. O segundo elemento que se deve reconhecer é que Freixo (assim como todo o PSOL, sobretudo no Rio de Janeiro) representou a crítica às políticas de conciliação de classe do petismo, em especial à aliança política de Lula com Sérgio Cabral, o antigo rei do Rio. O nome de Freixo e o PSOL se consolidaram no cenário político fluminense na denúncia às negociatas com dinheiro público que jorrou na exploração/especulação petrolífera do pré-sal e nas farras das Olimpíadas, Copa das Confederações e Copa do Mundo Fifa, com profundo impacto no Rio de Janeiro. Em síntese, Freixo e o PSOL representaram, consciente ou inconsciente, a crítica ao “novo-desenvolvimentismo” com base nas commodities e nos megaeventos, que favoreceram a condução do espaço urbano fluminense como negócios em todas as suas esferas. Freixo/PSOL compuseram a voz contra a especulação imobiliária, as remoções, os despejos, às violências estatais e paraestatais. Em decorrência das ameaças de morte que sofre, a presença de Freixo impõe a necessidade do aparato de segurança com o intuito de garantir a sua vida (a primeira vez que vi, confesso que fiquei impressionado, nunca tinha observado nada similar). Freixo e o PSOL representaram o enfrentamento ao “crescimento econômico” problemático da “era Lula”, que proporcionou o “milagrinho econômico” ao capital, enquanto que para a população pauperizada veio o encarecimento do espaço urbano e a precarização das condições de vida. Foi neste contexto que o PSOL construiu a sua viabilidade no Rio de Janeiro, como expressão parlamentar crítica às negociatas de Cabral e a modernização do lulismo, tendo Freixo um protagonista importante neste processo. Contudo, a despeito dos esforços, não se conseguiu transformar a expressão social alcançada pelo Partido do Socialismo e Liberdade no parlamento em organização popular, desde a base, nas comunidades fluminenses. Talvez resida aí os limites de Freixo e a experiência do PSOL até a atualidade. Óbvio que se tentou enraizar com os trabalhos políticos nas favelas, as ações de Marielle Franco no mandato de Freixo e no PSOL intentaram esse caminho, objetivo ainda não alcançado. A campanha à vereança de Marielle ganhou impulso após a declaração de apoio e voto de Chico Buarque, proeminência no mundo da cultura, não foi pela organização nos bairros e nas comunidades. Vale destacar que existem experiências e pessoas atuando fortemente com vistas a organizar a população, mas ainda não tem sido suficiente. Deve-se lembrar que a combativa vereadora Marielle Franco, ex-assessora do deputado Freixo, foi assassinada por ex-policiais vinculados às milícias. Ao invés da organização popular autônoma, nos subúrbios cariocas, o que se teve foi o crescimento do poder paralelo das organizações criminosas do tráfico de drogas e dos milicianos, com a benção de certos agentes do cristianismo fundamentalista e da teologia da prosperidade. As esquerdas não conseguiram alavancar a organização popular nas comunidades. Das várias diferenças identificadas na formação do PT em relação ao PSOL, deve-se considerar que o Partido dos Trabalhadores foi constituído no crescimento das lutas sindicais e populares, ademais, a sua construção como partido organizado nacionalmente levou toda a década de 80 do século passado, queContinuar lendo “Acerca de Freixo”