O marxismo de Octávio Brandão

Farmacêutico, jornalista, editor e radialista, foi dirigente político e um dos primeiros teóricos do Partido Comunista do Brasil (PCB) Por Gilberto Maringoni e Paulo Alves Junior * BRANDÃO REGO, Octávio (brasileiro; Viçosa/AL, 1896 – Rio de Janeiro/RJ, 1980) 1 – Vida e práxis política Octávio Brandão nasceu e passou seus primeiros anos em Viçosa, cidade do interior de Alagoas, núcleo de uma região produtora de açúcar dominada por oligarquias agrárias e com pouco desenvolvimento social. Segundo suas memórias, sua formação se deu no seio de uma “pequena-burguesia urbana empobrecida”, que embora adepta de ideias progressistas, era vítima do poder de grandes proprietários rurais “semifeudais”. A morte da mãe, quando Brandão tinha apenas quatro anos, o afetou muito. A partir daí viveria com um tio, em uma pequena casa tipicamente cabocla, no engenho do Barro Branco, regressando à Viçosa só quando seu pai voltou a se casar. Frequentou a Escola Silva Jardim, no ensino fundamental, na qual teria um primeiro contato com ideias evolucionistas, por meio de um professor. Em 1911, quando já morava com outro tio em Maceió – estando matriculado no Colégio Marista –, ficou órfão também de seu pai, homem de ideias republicanas e progressistas. Apesar de criado em um meio conservador católico, rompeu com a religião aos 16 anos, influenciado pela educação paterna, que lhe incutira o questionamento à hipocrisia social; este foi um marco emocional e intelectual dessa fase de sua vida na capital alagoana. Além disto, a percepção da situação de miséria da maior parte da população e o impacto das notícias da Revolta da Chibata (1910) e das greves operárias no Sudeste atraíram cada vez mais sua atenção para os graves problemas do país. Entre 1912 e 1914, residiu na capital pernambucana, onde se diplomou na Escola de Farmácia do Recife (atualmente parte da Universidade Federal de Pernambuco). Logo após a formatura, regressou a Maceió. Ali tomou contato com as principais obras da literatura universal e desenvolveu um agudo interesse científico, o que o fez se voltar para as ciências naturais. Aos 20 anos, empreendeu uma série de viagens pelo interior de seu estado para conhecer sua formação geológica e riquezas naturais. Baseado nestas pesquisas, em 1916 começou a escrever Canais e lagoas (publicado em 1919) – livro que descreve o complexo hídrico Mundaú-Manguaba e pode ser visto como uma das primeiras pesquisas ecológicas brasileiras. Sobre o tema, pronunciou também diversas conferências em Maceió, mostrando evidências da existência de petróleo na região e desde cedo observando a importância que poderia ter a prospecção petrolífera para a economia brasileira. No ano de 1918, começou a escrever para imprensa anarquista – colaborando com o Diário de Pernambuco e tendo fundado o jornal O Povo. À época, vinculou-se também a movimentos de trabalhadores urbanos e rurais, defendendo a jornada de 8 horas e a reforma agrária. Foi preso pela primeira vez em 1919. Depois de libertado, passou a ser perseguido, o que o fez partir, no mesmo ano, para o Rio de Janeiro – onde residiria até 1931, quando foi forçado a deixar o país. Na capital da República, travou contato com o mundo intelectual e político, em especial com Astrojildo Pereira (1890-1965) – que viria a ser um dos fundadores do Partido Comunista do Brasil (PCB), em março de 1922. Ali, o alagoano se mostraria impressionado com as mobilizações operárias, tendo se aprofundado nos estudos sobre a Revolução Russa. Passou então a escrever nos jornais anarquistas A Plebe, A Vanguarda e na Revista do Brasil (de São Paulo, dirigida por Monteiro Lobato), colaborando ainda com o Spartacus e o Imparcial (Rio de Janeiro), além da revista alemã Ekenntnis und Befreiung [Reconhecimento e Liberação]. Com tais atividades, teve acesso à literatura marxista que chegava ao país – e vem desses tempos sua desilusão com o anarquismo e sua rápida adesão às ideias de Marx e Engels. Em 1920, passou a integrar o integrar o Grupo Comunista Brasileiro Zumbi. Casou-se no ano seguinte com a poetisa e sua companheira de lutas, Laura Fonseca da Silva. Embora não seja um dos fundadores do PCB, Octávio Brandão acompanhou seu desenvolvimento desde o início. Aderiu ao Partido, a convite de Astrojildo, em outubro de 1922. Logo se tornaria dirigente (membro da Comissão Central Executiva) e começaria a estudar metodicamente os clássicos marxistas. No período, adquiriu uma pequena farmácia, estabelecimento que viria a ser uma espécie de escritório e ponto de encontro de militantes populares. Suas pesquisas sobre a Revolução Bolchevique de Outubro resultaram no livro Rússia proletária, escrito neste mesmo ano. Em 1923, já integrando o Comitê Central do Partido, empreendeu uma ousada tarefa: traduzir para o português o Manifesto Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels – a partir da edição francesa revisada pelo próprio Engels. No mês de julho do ano seguinte, explodiu em São Paulo uma revolução que tinha como objetivo derrubar o governo do presidente Arthur Bernardes (1924-28) – que manteve um Estado de sítio permanente ao longo de todo o mandato. Perseguido pela repressão, Octávio Brandão viveria na ilegalidade entre 1924 e 1926, mantendo-se atento aos acontecimentos. Em uma tentativa de dar resposta às questões políticas levantadas pela insurreição, ainda em 1924 redigiu grande parte de sua mais importante obra, Agrarismo e industrialismo – elaborada com colaboração da direção do PCB –, a qual seria complementada e publicada dois anos depois sob o pseudônimo de Fritz Mayer (usado para despistar a polícia). Em 1925, Brandão foi um dos fundadores e o primeiro editor de A Classe Operária, órgão oficial do PCB. À época, ministrou também cursos de teoria política para grupos de operários, em um paciente trabalho de formação, além de fazer panfletagens e vários discursos em manifestações públicas. Em 1927, tornou-se editor-chefe do diário A Nação – que difundia as ideias comunistas entre os trabalhadores. No mesmo ano, com Astrojildo Pereira e outros dirigentes e ativistas, fundou o Bloco Operário, fachada legal do Partido (então na clandestinidade) – uma organização legal e de massas, cujo nome, em 1928, passou a ser Bloco Operário eContinuar lendo “O marxismo de Octávio Brandão”