O marxismo de Maurice Spector

Jornalista, editor, advogado, dirigente político, foi fundador do Partido Comunista do Canadá, com o qual depois romperia, passando a promover a Oposição de Esquerda Internacional, de linha trotskista Por Sean Purdy, Pedro Rocha Curado e Argus Abreu de Morais SPECTOR, Maurice (russo-ucraniano-canadense; povoado desconhecido/Império Russo, 1898 – Nova Iorque/Estados Unidos, 1968). 1 – Vida e práxis política Maurice Spector nasceu na região ocidental do Império Russo, território da atual Ucrânia. Filho de um pequeno comerciante e de uma dona de casa, ainda bebê imigrou com a família para o Canadá. Já na adolescência, entrou para o movimento socialista, filiando-se ao Social Democratic Party [Partido Social-Democrata] do Canadá e começando a escrever artigos para seu jornal, The Canadian Forward [A Vanguarda Canadense]. Com vinte anos de idade, ele leu a tradução ao inglês do texto “Os bolcheviques e a paz mundial” (1914), de Leon Trótski – posteriormente editado com o título “A guerra e a Internacional”. Durante sua graduação em Direito na Queen’s University (Kingston, Canadá), Spector teve contato com as obras de Lênin e de outros comunistas russos e europeus. Entre 1918 e 1921, junto a camaradas socialistas – como Florence Custance e Thomas J. Bell –, organizou um coletivo de propaganda, a Plebs League [Liga dos Plebeus], e um grupo de formação política, o Toronto Workers Educational College [Faculdade dos Trabalhadores de Toronto], este último comandado por Jack MacDonald. Essas duas agremiações, contando com o apoio da Internacional Comunista (IC), estiveram entre as principais forças políticas que se reuniram na cidade de Guelph (Ontário) com o objetivo de formar o Communist Party of Canada/ Parti communiste du Canada (CPC) [Partido Comunista do Canadá], em 1921 – do qual o jovem Spector foi um dos fundadores. Como ocorreu em muitos países à época, o intelectual e socialista canadense, antes membro de um partido social-democrata com referências marxistas vagas, foi bastante influenciado pela Revolução Russa (1917). Segundo ele, a conquista do poder pelos bolcheviques tinha levado à criação de um novo tipo de socialismo, melhor fundamentado nas ideias de Karl Marx e Friedrich Engels – e tendo como prioridade a formação de partidos revolucionários ao redor do mundo. Eleito presidente do recém-nascido CPC, Spector escreveu seu primeiro programa partidário, juntamente com seus camaradas Custance e Tom Bell. Além disso, ajudou a estabelecer a base organizacional, intelectual e política da nova entidade comunista que, até 1925, chegou a organizar 5 mil militantes – tendo influência decisiva em importantes greves e mobilizações sociais. Teve também uma participação importante quando atuou como interlocutor da direção do partido junto às “Federações Nacionais”, as quais eram compostas por imigrantes membros do CPC, divididos em seus respectivos grupos nacionais, que constituíam a maioria da militância partidária. No período de 1921 a 1928, foi editor do jornal semanal do CPC, The Worker [O Trabalhador], e da revista mensal do partido, Canadian Labor Monthly [Mensário Canadense do Trabalho], escrevendo centenas de artigos sobre a conjuntura da luta de classes, a economia política e os eventos internacionais do movimento comunista, além de promover debates e comícios por todo o país. Ao longo dos anos 1920, tornou-se o dirigente e intelectual político central do CPC, participando dos principais debates do partido e atuando como seu delegado no IV Congresso da Internacional Comunista, em 1922. Em 1923, viajou por várias cidades do Canadá, proferindo sete palestras em duas semanas e percorrendo de trem mais de três mil quilômetros. Regularmente, falava em eventos para centenas de trabalhadores, e acompanhava piquetes, greves e outros atos do movimento operário e comunista. Em seus escritos e intervenções públicas do período, Spector se dedicou a transmitir ao povo canadense os mais importantes debates e argumentos dos revolucionários bolcheviques, além de tratar de notícias políticas internacionais em evidência, como a Revolução Alemã. A partir de 1924, alguns membros do CPC passaram a se contrapor às posições da IC contrárias a Trótski e à corrente soviética Oposição de Esquerda. Spector redigiu então uma declaração de seu partido à Internacional, argumentando não haver motivos suficientes para punir Trótski. Em 1927, Spector foi o mais votado entre oito candidatos para o Comitê Central Executivo do CPC – embora no partido houvesse também muitos adeptos da IC, então comandada por Josef Stálin. No ano seguinte, seria eleito membro do Comitê Executivo da Internacional Comunista, vindo a participar do VI Congresso da organização, em Moscou (1928). À época, Spector e o delegado dos Estados Unidos, James P. Cannon, não se alinhavam ao trotskismo. Mais tarde, ambos reconheceriam que ainda não entendiam bem o que estava acontecendo na URSS e no movimento comunista internacional. Com efeito, informações sobre os debates políticos internos soviéticos eram ainda escassos e mesmo evitados pelos dirigentes da III Internacional e de seus partidos membros. Entretanto, a postura dos dois comunistas mudaria após terem contato com o documento “Crítica ao programa provisório da IC”, escrito por Trótski quando ele já havia sido expulso do partido e enviado para viver no Cazaquistão Soviético. O texto – que circulou com o aval da IC, conforme as normas vigentes do “centralismo democrático” – tinha sido traduzido para o inglês e distribuído aos delegados presentes; nele, Trótski criticava diretamente as posições de Stálin e de Nikolai Bukharin, enfatizando os problemas relacionados à defesa da ideia de “socialismo em um só pais” e a desistência, por parte do governo soviético, da política da “frente única”. Spector e Cannon guardaram cópias desta tradução e voltaram a seus respectivos países, onde passariam a discutir suas desfiliações dos partidos comunistas alinhados com a IC. Juntamente com comunistas da França, Alemanha e Reino Unido, começaram a gestar a Oposição de Esquerda Internacional – influenciada por Trótski. Em novembro de 1928, o marxista canadense, que havia sido considerado suspeito de ser simpático à oposição trotskista, escreveu uma carta ao Comitê Central Executivo do CPC detalhando seu pleno apoio às críticas feitas por Trótski à III Internacional. No mês seguinte, Spector e mais doze membros, que se puseram a seu lado, foram expulsos do partido. Diferentemente do estadunidense James CannonContinuar lendo “O marxismo de Maurice Spector”